Numa manhã de segunda-feira de Setembro, a agência de viagens britânica Thomas Cook declarou falência. Entre os seiscentos mil clientes que estavam de férias, cerca de cento e cinquenta mil britânicos ficaram apeados nas mais diversas partes do mundo, obrigando o governo a pôr em marcha o maior plano de repatriamento desde a Segunda Guerra Mundial. O fim da empresa implica também o despedimento de mais de vinte mil pessoas, cerca de nove mil só no Reino Unido.
A Thomas Cook foi criada em 1841, quando o fundador começou a organizar as viagens dos membros do movimento de Temperança. No século XIX, os movimentos de Temperança alertavam para os efeitos perniciosos do álcool e advogavam a abstinência alcoólica; Cook organizava o transporte para as reuniões e manifestações em diversas localidades britânicas. A companhia cresceu verdadeiramente a partir do momento em que o filho de Cook, John Mason Cook, chegou a sócio em 1872, altura em que a empresa passou a chamar-se Thomas Cook & Son.
Em Itália, por exemplo, os viajantes britânicos dispunham de cupões que podiam ser utilizados nos transportes ferroviários italianos. A empresa evoluiu de tal forma que é considerada uma das responsáveis pela ideia de turismo moderno.
Um especialista na área de turismo afirmou que “a companhia nunca se adaptou à mudança de gostos, de modas ou de tendências do mercado.” Esta ideia é confirmada por vários jornalistas, que notam que os problemas remontam a 1994, quando uma alteração legislativa permitiu o crescimento de companhias aéreas como a easyJet e a Ryanair. A revolução digital que se seguiu, e que cimentou o crescimento das low cost, também mudou a maneira como as pessoas viajam e introduziu alterações radicais no turismo, como podemos observar pelos casos sintomáticos de Lisboa e Porto.
Afirma-se que o Brexit e as ondas de calor no Norte da Europa diminuíram o número de clientes da Thomas Cook, mas esses aspetos são crises no mercado que afetam qualquer empresa, em qualquer negócio; falar destes como causas para o fim de uma empresa com 178 anos parece anedótico e explica muito pouco, sobretudo numa altura em que, depois de uma crise de identidade, as agências de viagens voltam a mostrar-se como agentes significativos no mundo do turismo. Uma empresa é o reflexo dos clientes que atrai, e será tão mais relevante quanto ajude a moldar o negócio em que opera e, através desse, a sociedade em que se insere. A Thomas Cook falhou ao não reconhecer as alterações sociais das últimas décadas, reagindo e adaptando-se tarde de mais; em vez de ser o agente dessas alterações, como na sua génese, deixou-se arrastar por elas. É sempre irónico, e triste, ver uma empresa sucumbir às alterações do próprio sistema que ajudou a conceber.